Coluna Opinião
17/01/2011
Nas últimas semanas só se falou dele. Bem ou mal, Ronaldinho Gaúcho esteve no centro das atenções de uma arrastada e aflitiva peleja comercial. A disputa transcorreu freneticamente fora dos gramados, alimentada por ávidas bancas de investidores. Com o aval dos novos donos da bola (e dos cofres), uma trinca de clubes e seus dirigentes enfrentaram-se numa pelada de quinta categoria para ter o craque dentro das quatro linhas. Levou o rubro-negro da Gávea, que agora terá o privilégio de vê-lo desfilar suas cores pelos gramados do futebol brasileiro.
Mas, como esta conta será paga? Os valores não são conhecidos, mas as estimativas impressionam . Próximo a R$ 1 milhão de remuneração mensal, o jogador ocuparia um respeitável lugar no privilegiado clube de estrelas do futebol mundial, com um dos maiores contracheques do planeta. Nada mau para quem vinha perdendo espaço no outrora cobiçado futebol europeu. Gaúcho retorna ao Brasil com o status de grande ídolo e com a conta bancária tão recheada quanto nos seus tempos de Milan.
Os riscos existem e serão altos. Quando a bola começar a rolar, a pressão pelos resultados dentro de campo cobrará o preço pelas inevitáveis badalações fora dele
Para o Flamengo e seus parceiros, a aposta no astro segue uma fórmula já consagrada por algumas experiências de um passado não tão distante assim. A chegada de um "fora de série", capaz de multiplicar como Midas os valores investidos na sua contratação, deu certo com Romário, em 1995. Deu certo com Adriano, no ano passado. E vem dando certo com Ronaldo, nos dois últimos anos, no rival Corinthians. Apesar de contextos e personagens distintos, a receita é a mesma.
O mercado do esporte de alto rendimento esconde uma lógica difícil de ser reproduzida nos demais segmentos da atividade econômica. Movido pelo combustível da paixão, o futebol consegue girar as engrenagens de um poderoso dínamo financeiro, cujos limites são impossíveis de precisar. O torcedor, no papel de consumidor do produto do time de seu coração, não faz firula na hora de decidir . A camisa tem o nome do novo craque? Ele compra. A estrela vai estar no estádio? Ele paga para ver. Os ingressos se esgotaram? Os índices de audiência do rádio, da TV e, agora, da internet vão às alturas. E estas são apenas algumas das evidências mais óbvias do sucesso de um empreendimento do gênero: o craque vende produtos, lota estádios e cria uma legião de admiradores que irão acompanhar suas performances mídia afora. O sucesso é instantâneo, garantido e inevitável.
A pergunta é: até quando? Em um investimento de tão longo prazo, a preocupação dos operadores do negócio deve ser a de alongar ao máximo os bons ventos que cercam a euforia em torno da contratação de uma estrela de tal magnitude. Ronaldinho precisará corresponder dentro de campo, isto é certo. Mas, na batida do sentimento de uma nação inteira, existem pelo menos dois níveis de retorno a serem considerados: em um âmbito menos tangível, correspondente a valorização institucional da marca Flamengo, ocorre um impacto altamente positivo e no resgate de autoestima de seus aficcionados. Como decorrência disso, abre-se um segundo leque de opções para otimização dos ganhos, estes bem mais tangíveis, correspondente a ampliação e valorização das receitas comerciais que cercam o esporte.
É aí que Ronaldinho poderá fazer toda a diferença. O interesse em associar marcas, produtos e serviços ao jogador será uma tônica, justamente quando as atenções estarão todas voltadas para o país que se prepara para sediar a próxima edição da Copa do Mundo de Futebol em 2014. Não faltarão parceiros comerciais dispostos a pagar para fazer uso da imagem do atleta com a finalidade de vender produtos. Também crescerá a procura, acarretando um significativo aumento das formas de patrocínio ao clube. Atuando como relações públicas, Ronaldinho poderá ainda abrir portas para o Flamengo em todas as direções, atraindo desde convites para a participação do clube em eventos esportivos, até uma expressiva multiplicação do rol de produtos licenciados com a marca Flamengo, dentre inúmeras outras possibilidades.
Não tem segredo. O personagem em questão sintetiza como poucos a era do sportbusiness e conhece as regras de ouro que comandam o esporte espetáculo. Capaz de alimentar paixões e ódio, vislumbrou a próxima jogada com a premonição que só os verdadeiros craques possuem: entre a nostalgia de um passado gremista e os atrativos da capital financeira do país, preferiu o glamour dos palcos cariocas, onde a possibilidade de desfrutar a aura de celebridade, numa cidade que transpira boemia, não exclui o resgate do brilho perdido dentro dos gramados. Ronaldinho, assim como os outros R´s que o precederam, tem carisma e futebol de sobra para dar a volta por cima, ainda que cercado pelas tentações de um Rio de Janeiro sempre em temperatura máxima.
Evidentemente que, os riscos existem e serão altos. Quando a bola começar a rolar, a pressão pelos resultados dentro de campo cobrará o preço pelas inevitáveis badalações fora dele: a praia, o carnaval, as festas e toda a atmosfera de diversão que o Rio oferece, provavelmente não ficarão privadas de sua presença. Ronaldinho tem o DNA da alegria, que combina a música com a alma da cidade. Resta saber se o craque sucumbirá ao pop star. Se tiver um mínimo de bom senso, dosará o trabalho e a diversão. Se faltar-lhe o equilíbrio emocional para separar a entrega necessária de um atleta ao seu trabalho, em razão das possibilidades de lazer - compreensíveis e bem vindas para um jovem saudável e bem sucedido - Ronaldinho pode se tornar um vilão, jogando na lata do lixo todo o clamor popular que se forma pela sua presença na Copa de 2014.
A torcida do Flamengo confia entusiasticamente no renascimento do ídolo, agora travestido de pele rubro-negra. E o Brasil aguarda com expectativa a volta do bom e velho Ronaldinho, dos lances memoráveis e das conquistas marcantes. Seu retorno tem tudo para ser um divisor de águas do mercado de esporte brasileiro.
*Luiz Léo é professor de Marketing Esportivo
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