Passados mais de seis anos da confirmação da candidatura do
Brasil a sede da Copa do Mundo de Futebol de 2014, nada ficou pronto. Das 12
cidades-sedes (parte delas exigidas pelas autoridades públicas brasileiras à revelia
dos organizadores do evento) nenhuma está completamente acabada. E poucos dos projetos
que integram a matriz de responsabilidades assumidas pelos entes federativos
serão integralmente concluídos, antes do apito inicial para a primeira partida,
na tarde de 13 de junho próxima.
Exagero dos críticos ? O velho complexo de vira latas ?
Ocaso do destino ? As explicações para tentar justificar os descompassos são muitas,
mas a conclusão mais lógica para sintetizar o problema é uma só: haverá Copa,
mas bem distante das projeções ufanistas (repetidas quase como um mantra) nas
esferas governamentais: “será a melhor Copa de todos os tempos”. Não será. E o Brasil corre sério risco
de passar uma imagem deplorável para o mundo. O tal legado intangível está
seriamente comprometido –a custa de um investimento público que, “nunca na
história deste país (e de nenhum outro)” jamais se fez.
Noves fora a completa ausência de planejamento e uma visão
estratégica míope -pois
magalomana-, não são apenas as inconsistências no projeto que explicam o fracasso.
Reduzir aos notórios desvios e a malversação de recursos públicos é outro grave
erro: a culpa do descalabro nas contas não está somente no mau-caratismo dos
agentes inescrupulosos que vampirizam o evento. Assim como, não se restringe à incompetência
e à péssima qualidade dos serviços prestados pelo empresariado nacional os
motivos do caos instalado. Sozinhos, nenhum destes fatores seriam capazes de
semear tanta desgraça. A maior
lição que se poderia tirar do evento é que estamos completamente despreparados
para um maior protagonismo internacional. Seja lá em que área for.
A Copa é apenas um reflexo do que somos, como nação. Na
ambição desmedida de integrarmo-nos a uma lógica global, a atração dos grandes
eventos internacionais servirá como um espelho de narciso às avessas. O mundo
descobrirá um país com péssima infra-estrutura (de transportes, de alimentação,
de hospedagem, de telecomunicações, dentre outros), inseguro, violento e
profundamente desorganizado –além de desunido como nunca !
O menor dos problemas nesta altura (de um campeonato que
sequer começou) são os estádios -pasmem !!!-, ainda inacabados. Ou as obras de
infra-estrutura, quando não sumariamente abandonadas, em ritmo frenético (mas
longe de sugerir a viabilidade de sua conclusão) no entorno das cidades que
receberão os jogos. Inaceitável é o caos absoluto no cotidiano das populações e
o dispêndio de dinheiro sem nenhum critério, para tentar deixar tudo pronto.
Naturalmente, existe uma enorme diferença entre deixar
pronto e fazer bem feito. Os gastos desenfreados não tem qualquer compromisso com
a moralidade e a transparência prometidos deste o início, pelos principais
agentes envolvidos. E nisso erramos todos: políticos, empresários, cidadãos. O
orçamento global sofreu aumento desmedido e algumas cidades tiveram majoração
nas verbas comprometidas com a construção dos estádios na ordem de 100% (como é
o caso do Maracanã, cuja reforma saltou de R$ 600 mi para R$ 1.2 bi). Deixar
como está é inadimissível, seja em que nível for.
Não há dúvida que o povo brasileiro deixará aflorar sua alma
alegre e promoverá uma bonita festa para celebrar o segundo mundial no país.
Mas, as evidências de que não existem mais bobos (nem dentro, nem fora dos
gramados) está mais do que cabalmente demonstrada em cada rua vazia de
decorações festivas e em cada dorso desnudo da camiseta verde amarela, que
antes tanto nos enchia de orgulho e esperança. O Brasil está mudando e não será
surpresa sairmos desta experiência, senão campeões da bola, quem sabe,
aprendizes de um ativismo cívico, cuja partida principal teremos a chance de
disputar, nas urnas, meses após a bola ter parado de rolar. E é lá onde não
podemos fazer feio...
Um comentário:
Achei muito bom o seu artigo: claro, conciso, crítico, antenado.
O melhor de tudo é ler um texto feito por um brasileiro que não se esconde e não é obrigado a elogiar porque deve aos políticos.
Você não precisa elogiar ou esconder a poeira (o lixo!) debaixo do tapete.
Muito obrigada
Rose Esquenazi
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