quinta-feira, 27 de julho de 2017



Lamentavelmente a sua hora vai chegar

Está cada dia mais difícil defender o Zé. E olha que sou da trupe da resistência. Dos que não envergam fácil com as burras unanimidades das redes sociais – a propósito, me pergunto o que estaria escrevendo o velho Nelson, diante da profusão de nonsense da vida online.

Noves fora as unanimidades, minha premissa é a de sempre: valem mais os ideais do que a lógica. Romântico, ainda me deixo seduzir por um clássico aforismo gaveano: “craque a gente faz em casa”. O Zé é cria de lá ! Se formou dentro das quadras rubro-negras, como treinador de futsal. Evoluiu na carreira aos poucos, conquistando seu espaço com inteligência e serenidade.

E como qualquer jovem talento, oscila. É natural. Erros fazem parte do aprendizado, embora a profissão escolhida não permita os excessos. Existem sempre os 190 milhões de concorrentes para dar pixotada na escalação alheia, na tática adotada, nas substituições equivocadas.

Ser professor no Brasil não é moleza ! Dentro ou fora de campo J. É mais fácil matar um leão de juba grande por dia. E num clube como o Flamengo a potencia dos desacertos é multiplicada pelo número de estrelas do céu. A passagem para o inferno vai num pulo.

Desde que substituiu o “sabe-tudo” Murici Ramalho, o treinador do Flamengo vem entregando bons resultados. Na temporada 2016 classificou um elenco desacreditado para a Libertadores. E, mais importante do que a classificação, proporcionou uma enorme evolução à equipe, que chegou a lutar pela conquista do título nacional. Cheirou e não levou. Mas, foi por pouco.

O bom trabalho gerou expectativas para a atual temporada. O clube deu um ótimo respaldo à turma do gramado, com uma governança equilibrada e metas administrativas alinhadas a uma projeção otimista de resultados técnicos dentro do campo. Trabalho planejado desde o início da temporada, montagem de elenco, contratações aos baldes (algumas de oportunidade, cujo timing e efetividade são discutíveis). Tinha tudo para funcionar.

E funcionou ! Pela segunda temporada seguida o Flamengo está na parte de cima da tabela da principal competição nacional. Foi campeão estadual. Está na semifinal da Copa do Brasil. Não é pouca coisa. Em números são 47 jogos oficiais, com 27 vitórias, 14 empates e 06 derrotas, com 88 gols marcados e 39 sofridos. Aproveitamento próximo aos 60%. Melhor do que a maioria dos medalhões que figuraram na Gávea, nos últimos anos.

Mas, a eliminação na Libertadores ainda assombra os mais incautos. Mesmo que tenha sido a primeira vez do treinador, entra na sua conta a frustração por uma sequencia constrangedora de eliminações nas primeiras fases da competição continental. Desde lá, as perseguições se intensificaram. As cobranças ganharam contornos de histeria. Da torcida, por funcionar no termômetro da paixão – que é péssima conselheira. Da crônica, por se considerar mais sabida que os que calçam as chuteiras e vivem a dura rotina dos gramados. Do conforto de uma poltrona ou da segurança de um estúdio (e/ou redação) todos tem a receita fácil do sucesso.

É uma pressão incompreensível e contraprodutiva. Trabalha contra o próprio patrimônio. Não bastassem os constantes reclames dos injustiçados, fundadas na estapafúrdia teoria do apito amigo, os próprios rubro-negros geram uma atmosfera de constrangimento que só atrapalha. Tira o equilíbrio de quem mais necessita de tranquilidade para desempenhar com competência seu papel: técnico e jogadores. No climão de fora todo mundo, nem o Vaz se acerta (como se isso fosse possível)...

O jogo contra o Santos é um claro reflexo da atmosfera pesada que paira sobre a Gávea. Escalação equivocada, atuações abaixo da crítica e o fantasma que reaparece a cada decisão. O Flamengo involui e isso é óbvio. Como óbvia também deveria ser a constatação que as pressões excessivas só atrapalham, contribuindo, mais do que tudo, para os retrocessos.

Não fosse um país que vive o futebol com o ardor que deveria dedicar à política – muito mais relevante, aliás –, estaríamos seguros que, apesar das naturais adversidades, a nau está no destino certo. A tripulação é talentosa e o comandante sabe onde quer – e pode – chegar. A histeria coletiva acabará promovendo uma lamentável insubordinação a bordo, que levará à degola daquele que, houvesse paciência e bom senso, poderia se tornar um técnico de futuro.

Mas, apesar da resistência admirável dos seus atuais mandatários, tudo indica que o Flamengo retomará a velha sina de desvalorizar a quem formou e prestigiar os que se dizem rubro-negros de ocasião – de olho numa boa oportunidade de mercado. Um passo para trás dentro dos gramados, em completo desalinho com os acertos na administração da entidade. Tomara que, não apenas o Zé esteja errado de tudo – e de todos – desta vez.

domingo, 9 de julho de 2017

Muito aquém do futebol

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Foto: O Globo

Se alguém me perguntasse quem venceu o último clássico dos milhões, disputado em São Januário, numa fria noite de sábado, eu diria, sem pestanejar: o ódio. E de goleada.

O que era para ser apenas mais um jogo, terminou muito mal. Flamengo e Vasco (que, fosse qualquer país sério, teria tido como palco o Maracanã), nunca é um jogo qualquer. Há sempre algo a mais no ar. Envolve uma rivalidade maior do que qualquer competição em si.

E o clássico da vez tinha hora e lugar (sobretudo lugar) para dar errado. Não se trata de apostolar sobre a catástrofe, quando já acontecida. É um simples exercício de lógica.

Com Maracanã inviabilizado pela incompetência pública, São Januário foi reformado para sediar os jogos do Vasco da Gama como mandante. É justo e compreensível que seus dirigentes decidam usar o equipamento para recuperar os investimentos e assegurar boa performance técnica à equipe, que treina e se sente a vontade jogando em seus domínios.

Porém, um clássico é um clássico. E como, dito antes, não é um clássico qualquer. Envolve as torcidas com a maior animosidade por metro quadrado da cidade. Uma cidade já combalida por crises em todos os seus setores, com governantes presos, delinquência nas ruas e situação econômica pré-falimentar (acerca da qual, o Maracanã é uma das muitas e trágicas evidências). Um jogo dentro de uma cidade que vive à sombra de um desastre. E, neste clima, a partida foi marcada para um local, cuja logística é sabidamente preocupante.

Fosse qualquer jogo, este seria um mero detalhe. Mas, aquele envolvia um Vasco da Gama em dificuldades no campeonato nacional, após o retorno de (mais) um rebaixamento. Uma equipe cujos números na classificação não enganam nem os mais fanáticos torcedores. E que só não está em situação pior, por conta dos resultados que tem conseguido dentro de casa.

Do outro lado, o maior rival. Um time em franca ascensão, após um início titubeante. E por trás deste time, uma torcida gigantesca, mordida pelos últimos insucessos, em série, para o principal adversário. O terceiro contra o sexto, se os números da classificação fossem críveis.

A partida em si tornou-se o de menos. As cenas de batalha campal ocuparam todas as atenções de quem estava acompanhando a transmissão –e de quem tomou conhecimento da guerra, na velocidade das redes sociais. Mal soou o apito decretando o final da disputa, as arquibancadas ocupadas por 95% de vascaínos ganharam ares de trincheiras, com os “soldados” da vez atirando suas bombas, rojões e tudo o mais que encontrassem pela frente.

O que causou a deflagração ? Insatisfação com o resultado (o Flamengo venceu por magro e suado 1 x 0) ? Erros da arbitragem (péssima, como sempre e sempre) ? Provocações dos rivais (em infinito menor número e completamente acuados no curral a eles reservado) ?

Nos próximos dias, o noticiário policial irá trazer respostas. Espera-se que a polícia, afinal, consiga fazer o seu papel. Ou não. Para o “tranquilo” presidente vascaíno, a culpa é “deles” (dos outros). Erro de revista da PM, que "deixou entrar" verdadeiro arsenal no estádio. No estilo Eurico, barba mal feita, ranho escorrendo pelo nariz: “a culpa é da política”!

Ah, a política. Pelo menos nessa, o ex-deputado meteu um golaço. Tirou o corpo fora (como sempre), mas jogou a bomba (a derradeira ?), no colo de quem, de fato, merece cada cartão vermelho que lhes couber aplicar. As tensões acumuladas na cidade e no país, não são um mero detalhe. O que se vê na atualidade é de assustar selvagens. Menos aqueles que vestiam a cruz de malta na noite de sábado. Para eles, a Cruzada será sempre na próxima Colina.

E o ódio venceu. Mais uma vez...

LL